terça-feira, 31 de dezembro de 2013

SOBRE CAMOCIM...E SUAS EMBARCAÇÕES

Nesta última crônica do ano, nossa atenção vai para um dos cartões postais de Camocim – a enseada dos barcos, em sua variedade de cores e tamanhos, que já encheu os olhos de grandes velejadores conhecedores do mundo como Amyr Klink, assim como de muitos ricos e pobres mortais que percebem nesta paisagem natural, a intervenção humana, na sua mais lídima representação configurada nas embarcações que trazem o alimento do mar, fonte de nossa riqueza.
Tal paisagem, como se sabe, foi ou está sendo objeto de tombamento como patrimônio material e/ou imaterial por parte do IPHAN. Infelizmente não estamos vendo ainda ações educativas que expliquem aos camocinenses e aos visitantes o que isso acarreta, o que representa e quais as repercussões desse tombamento no que diz respeito à preservação da paisagem, o modo de construção dessas embarcações, dentre outros aspectos que envolvem uma ação desse tipo pelo órgão acima referido.
No entanto, minha observação neste momento vai para o modo como se nomeia as embarcações. Para além da exigência cadastral das mesmas junto à Capitania dos Portos é muito interessante a forma como é feita a nomenclatura. Parece haver uma relação de gênero nesse ato de batizar as embarcações. Talvez porque canoa seja um substantivo feminino (quem não já namorou numa delas numa noite enluarada?!), a grande maioria delas têm nome de mulher: da esposa, da filha, quiçá da amante. Vai desde o singelo e simbólico Maria, passando por Ivaneis, Camila, Sibila, Cybelle, Carmiliana, aos nomes que se referem ao oceano como Rosa e Rainha do Mar, só para ficar nestas, além daquelas com nomes compostos que agora me falta a lembrança. Ou seria uma forma de compensação do homem do mar de ter sua mulher amada materializada em sua embarcação na solidão das águas oceânicas?
Por outro lado, à medida que as embarcações mudam de tamanho, os nomes adquirem um viés masculino. Os bastardos que são barcos maiores, com maior volumetria ou metaforicamente viris são batizados de Arthur, Bruno, Chaves ou levam o nome de empresas de pesca, sem faltar aqueles de cunho religioso como Deus é Amor e Deus é Fiel. Poderia fazer outras tipologias, mas o que nos interessa é acentuar a beleza deste panorama que temos como característico do patrimônio cultural camocinense. Isso me fez recordar uma tarde distante do século passado no extinto Restaurante Odus quando observava estes barcos num bonito balé de maré cheia quando cometi alguns versos que foram parar numa canção de um festival também longínquo:
E eu daqui!
Olhando os mastros dos bastardos sem pano,
Mini-gigantes emergindo do mar
Como dedos do oceano! 
Feliz 2014 para todos!
Carlos Augusto Pereira dos Santos
Historiador
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