Nesta última crônica do ano, nossa atenção vai
para um dos cartões postais de Camocim – a enseada dos barcos, em sua variedade
de cores e tamanhos, que já encheu os olhos de grandes velejadores conhecedores
do mundo como Amyr Klink, assim como de muitos ricos e pobres mortais que
percebem nesta paisagem natural, a intervenção humana, na sua mais lídima
representação configurada nas embarcações que trazem o alimento do mar, fonte
de nossa riqueza.
Tal paisagem, como se sabe, foi ou está sendo
objeto de tombamento como patrimônio material e/ou imaterial por parte do
IPHAN. Infelizmente não estamos vendo ainda ações educativas que expliquem aos
camocinenses e aos visitantes o que isso acarreta, o que representa e quais as repercussões
desse tombamento no que diz respeito à preservação da paisagem, o modo de
construção dessas embarcações, dentre outros aspectos que envolvem uma ação
desse tipo pelo órgão acima referido.
No entanto, minha observação neste momento vai
para o modo como se nomeia as embarcações. Para além da exigência cadastral das
mesmas junto à Capitania dos Portos é muito interessante a forma como é feita a
nomenclatura. Parece haver uma relação de gênero nesse ato de batizar as
embarcações. Talvez porque canoa seja um substantivo feminino (quem não já
namorou numa delas numa noite enluarada?!), a grande maioria delas têm nome de
mulher: da esposa, da filha, quiçá da amante. Vai desde o singelo e simbólico Maria,
passando por Ivaneis, Camila, Sibila, Cybelle, Carmiliana, aos nomes que se
referem ao oceano como Rosa e Rainha do Mar, só para ficar nestas, além
daquelas com nomes compostos que agora me falta a lembrança. Ou seria uma forma
de compensação do homem do mar de ter sua mulher amada materializada em sua
embarcação na solidão das águas oceânicas?
Por outro lado, à medida que as embarcações
mudam de tamanho, os nomes adquirem um viés masculino. Os bastardos que são
barcos maiores, com maior volumetria ou metaforicamente viris são batizados de Arthur,
Bruno, Chaves ou levam o nome de empresas de pesca, sem faltar aqueles de cunho
religioso como Deus é Amor e Deus é Fiel. Poderia fazer outras tipologias, mas
o que nos interessa é acentuar a beleza deste panorama que temos como
característico do patrimônio cultural camocinense. Isso me fez recordar uma
tarde distante do século passado no extinto Restaurante Odus quando observava
estes barcos num bonito balé de maré cheia quando cometi alguns versos que
foram parar numa canção de um festival também longínquo:
E eu daqui!
Olhando os mastros dos bastardos sem pano,
Mini-gigantes emergindo do mar
Como dedos do oceano!
Feliz 2014 para todos!
Carlos Augusto Pereira dos Santos
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