Na atual conjuntura, onde desde junho do ano passado
os movimentos sociais, ou a população em geral saíram às ruas para protestarem
contra o governo e a realização da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, que a
violência policial é um tema recorrente. Se hoje, essa truculência pode ser
legitimada (pela corporação policial, é claro) pelos atos de vandalismo ao
patrimônio público e privado, o mesmo não poderia se dar com simples cidadãos
trabalhadores na década de 1960 no município de Camocim. Qual seria a razão de
tanta violência cometida pelos policiais? Seria uma pretensa relação com o
regime militar implantado em 1964? Notadamente, os casos eram tão recorrentes,
que os principais chegaram a ser discutidos na Câmara Municipal entre 1960 e 1971.
De qualquer forma, há que se destacar que o próprio vereador Otávio de
Sant'Anna, um oficial da Armada em Camocim, foi um dos primeiros à denunciar os
crimes perpetrados por policiais. Nas sessões de 29 e 30 de março de 1960 o
crime denunciado foi o cometido pelo policial Francisco Santana Filho que
assassinou em praça pública o trabalhador da beira da praia, Francisco Ribeiro
do Nascimento, mais conhecido como "Cícero Canário", depois de detido
pelo policial que o encaminhava para a cadeia local. O crime mobilizou até o
Deputado Murilo Aguiar, ao qual foi pedido providências junto ao Secretário de
Polícia do Estado. Em maio de 1963, as denúncias direcionadas ao então
comandante da 9ª Companhia, Capitão José Liberato de Lacerda era de que os pais
de família ao se deslocarem na madrugada para buscar algum remédio para um
familiar ou outra necessidade, eram "atacados impiedosamente pela patrulha
policial".
Seria um toque de recolher? Ainda em maio do mesmo ano, o
vereador Luiz Damião de Oliveira, que era salineiro se reporta às violências
cometidas pela tal patrulha que invadiu uma festa no Sindicato dos
Trabalhadores do Porto, onde "impiedosamente atacado, açoitado a pauladas
a ponto de quebrarem o braço de um filho de sócio do mesmo sindicato".
Nessa mesma sessão, a vereadora Carmelita Veras denuncia "as desordens
praticadas pelos policiais existentes no Distrito de Barroquinha (...)
invadindo as residências familiares". A violência parecia ser tanta que o
Presidente da Câmara ordenou a formação de uma comissão de vereadores que,
junto com o Prefeito foram pedir esclarecimentos ao Capitão Comandante da
Companhia de Polícia. As tratativas parecem não ter dado certo, assim como hoje
se verificam com as chamadas audiências públicas para tratar do assunto. No ano
seguinte, em 17 de abril de 1964, a Câmara repercute novamente a violência
policial no pedido do vereador Amanajás Passos de Araújo que pede que se tome
providências em "defesa dos pescadores do Rio Remédios, que o Delegado ali
vem perseguindo os pescadores e que a pesca no referido rio, seja livre".
Seria o delegado chegado a uma pescaria e queria o rio só para ele ou seus
amigos? Sete anos depois, o assunto retorna à Casa do Povo. Na sessão de 04 de
novembro de 1971 o vereador Antônio Mingueira Braga fez a leitura em plenário de um ofício da Colônia de Pescadores denunciando que o cabo Bernardino da Polícia
Militar tomava as facas dos pescadores que trabalhavam na beira da praia e
ainda os levavam presos. O ofício pedia a ajuda da Câmara para que os
pescadores pudessem "trabalhar sem constrangimento, o que dificilmente é
feito nessa praia, pois o referido policial quando da patrulha, comete destas
arbitrariedades, sem termos para quem apelar". Tradicionalmente as
relações entre pescadores e policiais nunca foram fáceis. Embora que os
documentos expressem apenas uma das partes na questão, não deixa de ser
recorrente a violência policial nos anais da história.
Carlos Augusto Pereira dos Santos
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Fonte: Câmara Municipal de Camocim. Livro de Atas das Sessões Ordinárias
Fonte: Câmara Municipal de Camocim. Livro de Atas das Sessões Ordinárias