domingo, 7 de julho de 2024

A PRECE SILENCIOSA

Por Avelar Santos*

Naquela tarde chuvosa, fria, um homem velho caminha com extrema dificuldade pela Praça do Vaticano.

Tudo é silêncio! 

Solitário, de cabeça baixa, corpo vergado pelo peso do mundo, que carrega nos seus ombros frágeis, sem nada reclamar, a passos lentos dirige-se à Cruz, postada perto da entrada da Basílica de São Pedro.

Com grande reverência fica, por alguns  instantes, a seus pés, clamando aos céus por compaixão.

E parece dizer na sua fervorosa oração: Por onde andas, Senhor, que não vês tanta dor, tanta angústia, tanto  sofrimento? Acorda! Vem depressa nos socorrer! Estamos todos perecendo!

E o Papa Francisco, após falar com Deus, rogando a ELE que intercedesse pela humanidade, afastando de vez da face da Terra esse vírus terrível, ceifador insaciável de tantas vidas inocentes, tem o seu rosto iluminado pela luz da esperança que brilha forte nos seus olhos de ancião.

Há pouco, entretanto, na entrega amorosa de suas súplicas, suas lágrimas confundiam-se com os pingos intermitentes da chuva, que molhavam o seu rosto, sendo acolhidas, prontamente, naquele bouquet de preces, no coração generoso do Pai.

E recordamos, nesse momento em que soçobramos nas águas turbilhonantes dessa pandemia, que assola o globo, e que nos amedronta a alma, uma belíssima passagem bíblica, narrada por Marcos: "Naquele dia, ao anoitecer, disse ele aos seus discípulos: - Vamos para a outra margem.

Deixando a multidão, eles o levaram no barco. De repente, levantou-se um forte vendaval, e as ondas se lançavam, furiosas, sobre a embarcação, de forma que esta foi se enchendo de muita água. 

Jesus estava na popa, dormindo com a cabeça sobre um travesseiro. Os discípulos o acordaram e clamaram:  - Mestre, não te importas que morramos?

Ele se levantou, repreendeu o vento e disse ao mar: -  Aquieta-te! Acalma-te!

Logo, o vento se aquietou, e fez-se completa bonança.

Então perguntou aos seus discípulos: - Por que vocês estão com tanto medo? Ainda não têm fé?

Eles estavam apavorados e perguntavam uns aos outros: - Quem é este que até o vento e o mar lhe obedecem?”

Nesses tempos difíceis que ora vivemos, onde o medo muitas vezes abala os alicerces da razão, provocando pânico nas pessoas, tirando-nos o sono, gerando estresse, que nos enclausura nas masmorras escuras da solidão, como seria bom  ouvirmos a voz do próprio Rabi reconfortando os corações de tantos aflitos.

Na verdade, ELE nos fala docemente todos os dias! 

Ao ouvir nossas orações,  encoraja-nos a afugentar para bem longe a tristeza que nos ronda e emudece. 

E mais! Ajuda-nos a atravessar, com segurança, na barca, para o outro lado. 

Pena que muitos de nós, por  ter uma fé menor do que um grão de mostarda, não se aperceba da SUA presença, ao nosso lado, aplainando os caminhos tortuosos de nossas vidas. 

Dias depois de sua aparição solitária, no largo da Santa Sé, que confrangeu o mundo, por todo o simbolismo contido no seu ato extremado de devoção, à Divindade, o Bispo de Roma, numa feliz homilia, exortou às pessoas a se entregarem à misericórdia divina, a buscarem o Altíssimo com simplicidade de espírito, porquanto ELE se faz ainda mais presente, na existência humana, notadamente nos momentos de dificuldades, daquelas travessias perigosas, acalmando-nos com o seu canto de amor.

Eis o farol da fé, levantado às alturas por Francisco, a alumiar as trevas desse vale tenebroso, que ora atravessamos, guiando os nossos passos, por vezes incertos, em direção à luz que aponta a trilha do Alto.

Nada temamos! 

Sigamos, pois, caminhando, confiantes na providência divina, amparados na certeza que nenhum mal nos atingirá se estivermos à sombra do Onipotente!

*Professor e Escritor Camocinense