Um dos muitos inventos bons criados à época da Revolução Industrial foi, indubitavelmente o trem, esse meio de transporte maravilhoso idealizado por George Stephenson, nas minas de Killingworth, com a construção da locomotiva a vapor, a Blucher, em 1814.
O espírito empreendedor desse extraordinário inventor britânico fê-lo, também, construir a primeira linha férrea, de aproximadamente 61 km, ligando Stockton à região mineira de Darlington, na Inglaterra, inaugurada aos 27 de setembro de 1825.
Daí em diante, o mundo jamais o mesmo!
No início, o trem serviu para incrementar o transporte das matérias-primas para as fábricas, de maneira eficaz, rápida, levando os produtos acabados às pessoas, inclusive àquelas daa regiões mais remotas.
Depois, com o passar do tempo, a invenção foi cada vez mais se aperfeiçoando, conquistando a Europa - e os demais continentes.
Assim, a ferrovia encurtou distâncias, facilitou as comunicações e permitiu a agilização do escoamento da produção agrícola e pecuária em quantidade e velocidade nunca vistas.
Em redor das estações ferroviárias nasceram e cresceram vilas e cidades, sonhos foram semeados, ao vento, e o progresso surgiu num piscar de olhos.
No Brasil, o Barão de Mauá foi o pioneiro do trem.
Através de uma concessão dada por D. Pedro II, ele construiu a primeira ferrovia em solo tupiniquim, que ligava a Baía de Guanabara à Petrópolis, cuja distância era de 14 km.
A viagem inaugural aconteceu no dia 30 de abril de 1854, cujo comboio foi puxado pela Baronesa, nome solene da locomotiva que entrou para a História.
No Ceará, a Rede Viação Cearense – RVC - teve grande importância para o desenvolvimento do Estado.
De Fortaleza, os trens levavam os produtos industrializados ao interior, e traziam, dali, coisas diversas da terra, para gáudio dos moradores da loira desposada pelo sol.
Os historiadores contam que o primeiro paquete ferroviário a circular, no Ceará, saiu da capital em direção à Pacatuba em 30 de novembro de 1873.
A Estação de Trem de Fortaleza, conhecida por Central, foi construída em 1880 - e sua denominação João Felipe deveu-se à homenagem ao ministro cearense, no governo de Floriano Peixoto, em 1946.
Por conta da grande seca de 1877, houve um êxodo significativo dos sertanejos cearenses, buscando lugares onde pudessem minimamente sobreviver.
Muitos aportaram em Camocim, vindo a participar da construção da mais bela Estação Ferroviária da Terra da Luz - do inesquecível Ramal Ferroviário Sobral - Camocim – em 1881, que durararia quase um século!
Eu e o trem somos irmãos!
Nas minhas veias, por certo, corre diesel - e os meus átomos são de aço!
Sou de uma família de ferroviários de três gerações consecutivas: bisavô, avô – e meu pai.
Nasci praticamente aspirando o delicioso perfume da saudosa Maria Fumaça, haja vista que a casa onde morávamos abraçava a Estação.
Minha primeira fala foi transcrita em Morse!
Cresci num universo de apitos que calavam fundo na alma - e éramos felizes.
Deleitei-me, muitas vezes, na mocidade, ao viajar de trem, cujos destinos eram, invariavelmente, Massapê, terra querida de meus avós maternos - e Fortaleza.
Esta última me recebia,6 sorrindo, nas férias escolares, à Avenida Imperador, próximo da Praça da Lagoinha, no coração da urbe, na casa do Sr. Valmir Pinto Paiva e de sua esposa: D. Ilca Girão.
Ele, chefe de trem, nascido em Lavras da Mangabeira, homem de bom humor, generoso, pai amoroso, torcedor do tricolor de aço.
Ela, filha de Morada Nova, mãe exemplar e funcionária de carreira do DNOCS.
Nos idos dos anos de 1970 caminhava-se, na capital, ainda provinciana, sem quaisquer atropelos ou quiçá medo de ladrões.
As vitrines chamativas das lojas aguçavam a nossa imaginação - e ser feliz era tão simples, meu Deus!
Aos domingos, íamos ao velho PV, distante poucas quadras de tudo, assistir os bons jogos do Nordestão.
No aconchego do lar, a televisão era algo mágico. Embora em preto e branco, coloríamos nossas tardes com os seriados: Mundo Submarino, Vigilante Rodoviário e Rin tin tin.
Os desenhos animados eram um capítulo à parte.
Ver o Zé Colmeia sempre às voltas com o guarda Belo, surrupiando lanches dos turistas, era indescritível.
E o que dizer dos Jetsons, o meu desenho favorito, com o futuro, diante dos nossos olhos estarrecidos, ao alcance das mãos?
Como era bom tudo aquilo, meu Paizinho do Céu!
Cedo da noite, o sono batia à porta, levando-nos, de pronto, ao Reino de Morfeu.
Da vida bucólica e alegre, hoje pouco resta!
Pessoas amadas partiram, para nunca mais voltar, deixando um vazio enorme, no coração, e uma tristeza sem fim na alma. O ontem se esfumaçou - e da magia extinguiu-se a chama.
Do trem, pobrezinho, ficou somente a doce lembrança.
Nada mais!
*Professor e Escritor Camocinense