Cidade amada!
Teus encantos mil, de bela mulher, me seduzem tanto e tanto que, cada vez que volto, feliz, aos teus braços, o meu coração se acelera, sorrindo de alegria, e, eu perco o compasso do passo.
Na quietude singela das madrugadas insones, eu me debruço, na janela do tempo, esperando o passado chegar bem de mansinho, trazendo, para mim, em vivas cores, flores de momentos tão sublimes que eu jamais esquecerei.
E a primeira lembrança que me vem, à mente, é aquela das manhãs cheias de luz, quando, cedinho, eu abria a porta do quintal de casa para ouvir, extasiado, o passaredo em festa, nas goiabeiras, enchendo os ares de maviosos cantos.
Depois, ia para a escola, passando, pela Martinelli, pelo Banco do Sr. Fernando Cela, pelo prédio imponente da Mercearia Serrote, pela Capitania dos Portos,, admirando, pelo caminho, o faiscar do sol no dorso do teu mar, que se agitava, contente, com a companhia do amigo.
E como não recordar os majestosos Rio Piancó e Areia Branca, atracados, no teu cais, enquanto o trem partia para mais uma aventura, por este mundão, sob nossos olhares gratos e atentos.
Como esquecer, meu Paizinho do Céu, a beleza das canoas, enfileiradas, todo finzinho de tarde, ali, na Pedra do Mero, onde podíamos escolher o peixe, sem quaisquer atropelos, pagando modestos cruzeiros ao mestre da embarcação.
E o que dizer das famílias sentadas, nas calçadas, à noitinha, pegando a brisa marinha, reforçando os laços de amizade, com a vizinhanca, falando, animadamente, sobre o cotidiano.
Nada há de mais belo do que tuas velas boiando, serenas, ao vento, nas noites de lua cheia, que risca da prata mais pura tuas águas de cor esmeralda.
Nos anos dourados da minha mocidade, em que eras menina moça, como eu gostava de ouvir os apitos plangentes dos navios ecoando, pela amplidão, na doçura infinita do teu entardecer.
E eis que, de repente, sem que eu me apercebesse, a inebriante vida do Camocim antigo, se esfumaçou, ficando estilizada, para sempre, na harmonia de tuas ruas, de um tablado de xadrez, na Pracinha do Amor, na nostalgia das páginas musicais da Voz de Camocim, nas serenatas ao luar.
Tudo isso se encontra tão fortemente enraizado, na memória, que levarei tais recordações, pela eternidade, visto que minha alma vagueia, pelo regaço de teus manguezais, buscando, pobrezinha, recompor os fragmentos esparsos dos tempos idos, que partiram de vez, e, ingratos, nunca mais voltarão.
É preciso que tenhamos profunda gratidão, ao Arquiteto Divino, que nos doou um pequeno paraíso, exaltado na exuberância de tua natureza; necessário se faz, também, voltarmos a ser crianças, onde todos os sonhos podem acontecer, para podermos sentir o grandioso pulsar da cidade, hoje, cosmopolita, mas que mantém, ainda, por graça dos céus, o seu carisma arrebatador e o brilho refulgente de sua chama, que um dia brilhou, no Farol do Trapiá, sob a luz difusa, bruxuleante, do caminhar das lamparinas celestes.
Sou apenas um rabiscador de poesia, apaixonado pela cidade do meu bem querer, cujos filhos, nessa data especial, deveriam rogar ao Senhor da Messe que não permita jamais que as esperanças, doces aves de arribação, partam em revoada dos pombais dos corações.
Viva Camocim!
*Professor e Escritor Camocinense